31 janeiro 2011

ADMIRÁVEL MUNDO NOVO – 1 (A nudez «Urbi et Orbi»)

Esta série de três postes inspirados pelo título do famoso livro de Aldous Huxley, é uma compilação comentada de três daquelas notícias que aparecem nos rodapés dos serviços informativos e a que não se costuma prestar grande atenção, mas que aqui servirão de pistas para reflexão do como vivemos num Mundo em mudança, mas também servirão de pretexto para nos interrogarmos em que direcção é que essa mudança nos conduz.

Durante Séculos a expressão Urbi et Orbi (À Cidade e ao Mundo) foi um privilégio de papas. E se soubéssemos de um vizinho que gostava de andar em pelota pela casa (dele) isso era uma curiosidade pitoresca compartilhada com o resto da vizinhança do bairro. Mas hoje, através do Google Street View, torna-se possível que o pirilau do seu vizinho (abaixo) possa ter uma notoriedade mundial equivalente à da leitura dos Votos de Boas Festas feita por Bento XVI.

ADMIRÁVEL MUNDO NOVO – 2 (O Fim do Princípio do Utilizador Pagador)

Considerada a mais antiga profissão do Mundo, a prostituição sempre mantivera durante todo esse tempo o mesmo sistema de funcionamento: existe um cliente que paga a uma prostituta para ter relações sexuais com ela. Actualmente, passou a haver bordéis onde o cliente não paga... Assina uma declaração cedendo os direitos da imagem, e as despesas da festa correm por conta dos assinantes que seguem o assunto via internet… Chamam-lhe Big Sister.

ADMIRÁVEL MUNDO NOVO – 3 (Um Prazer para um dos Sentidos)

O olfacto tanto pode ajudar (como o bouquet de uma aguardente velha) como perturbar (como o cheiro a chulé de certos queijos) o acto da degustação. Agora, há quem proponha que o olfacto substitua a degustação por completo, transformando a doçaria em vapores que se aspiram de um aparelho chamado Whaf (abaixo), em prol de uma gulodice dietética. É uma ideia interessante, mas tão válida quanto a de descobrir inversamente a que saberá uma mousse de Chanel nº 5

30 janeiro 2011

MAPAS DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL A LEMBRAR O JOGO DO RISCO

Não sei quantos daqueles que lêem este poste já terão jogado o jogo do Risco (acima). Eu fi-lo por duas ou três vezes e não gostei. Pretende-se que se trata de um jogo de estratégia mas as suas fases decisivas são decididas num jogo de dados e isso não tem estratégia nenhuma: é pura sorte, cuja distribuição das probabilidades se pode analisar aqui. Mas reconheço que o tabuleiro tem um mapa-mundo lindo…
Quando se envolveram na Segunda Guerra Mundial em Dezembro de 1941, os Estados Unidos dedicaram-se a fazer uma avaliação de quais seriam as potenciais ameaças por parte dos seus inimigos recentes. O resultado das hipotéticas invasões vindas da Europa, através do Oceano Atlântico, pode ser apreciado nestes três mapas (obtidos aqui), cujas setas e simplicidade fazem lembrar a estratégia do jogo do Risco
A sério, perante as duas mais poderosas potências marítimas da época, teria sido necessário, além da concentração das frotas alemã, japonesa, italiana e da França de Vichy (como se pode ler num dos mapas acima), que a frota combinada das potências do Eixo tivesse muita sorte aos dados para derrotar a sua homóloga anglo-saxónica e assegurar a supremacia naval no Atlântico que tornasse possível a invasão da América do Norte…

29 janeiro 2011

PORNOGRAFIA ANIMAL

(O poste é para ser lido ao som da Gymnopédie No.1 de Erik Satie)
As árvores despidas de folhas indicam-nos estarmos no Inverno e o alongamento das sombras mostram-nos que a hora será pouco depois do Sol se levantar ou pouco antes dele se pôr. De qualquer modo, um ambiente hostil de frio, como tem sido o dia de hoje, que afugentou quase todos os que então se tivessem disposto a passear pelo parque, que está quase deserto. Ao centro, duas pessoas e dois animais. Enquanto um dos cães lambe os genitais do outro, um dos transeuntes alheia-se momentaneamente da conversa em que participa e encara a objectiva como numa pergunta muda, se o fotógrafo já se apercebeu da cena pornográfica que está prestes a fotografar…

AMÉRICA...


Antes de conquistar a América com o papel de um médico tão brilhante quanto insuportável de aturar chamado Gregory House, Hugh Laurie notabilizara-se do outro lado do Atlântico sobretudo pelos seus papéis cómicos. No caso acima, trata-se de um sketch de um programa intitulado A Bit of Fry and Laurie, onde o actor arrasa o comportamento do norte-americano comum com uma imitação irónica de um certo estilo pimba de patriotismo dos habitantes do país que o fez vir a ter uma projecção que é hoje mundial. Não deixa de ser uma ironia encadeada noutra ironia…

28 janeiro 2011

OS PERCURSOS SINUOSOS DA PROPAGAÇÃO DAS REVOLTAS NOS PAÍSES ÁRABES

As notícias informaram-nos primeiro da contestação nas ruas na Tunísia. Agora, após o derrube daquele regime, e tentando aproveitar a dinâmica da contestação tunisina, os protestos propagaram-se ao Egipto e já atingiram o Iémen. As situações em cada país podem divergir pontualmente, mas explicaram-nos que todos esses países são ditaduras pessoais que se arrast(ar)am por decénios (23 anos na Tunísia, 29 no Egipto e 32 no Iémen) .
O que ninguém parece conseguir explicar é a lógica da propagação das contestações que as faz saltitar, eclodindo nuns países árabes, evitando outros. No mapa acima, veja-se como a dinâmica de contestação se propaga da Tunísia para o Egipto não se dando notícias de qualquer contaminação da Líbia, curiosamente um país onde o regime pessoal de Muammar Gaddafi supera em antiguidade qualquer das outras ditaduras árabes: 41 anos!
Tecnicamente, pode equacionar-se a hipótese dos líbios viverem tão contentes sob a sua direcção desde há quatro décadas, que não sintam necessidade de o derrubar do poder. Pessoalmente, prefiro a hipótese que, se as ditaduras permanecerem sólidas, reprimem quem protesta e bloqueiam as notícias para o exterior e não há margem de manobra para brincadeiras de rua como a da fotografia acima – note-se como o cartaz está redigido em inglês…

Estas histórias das revoluções coloridas ou floridas podem conduzir a que se escrevam análises disparatadamente apaixonadas com enredos com finais felizes, daqueles que todos nós gostamos nos filmes, mas as realidades sóbrias da geopolítica mostram que às vezes, nos países ao lado desses, os que não entram no enredo, a cor dominante continua a ser o cinzento chumbo da opressão...

27 janeiro 2011

«NOITE» DE SOMBRAS «E NEVOEIRO» DE VULTOS

Em 1955, por ocasião das celebrações do 10º aniversário do final da Segunda Guerra Mundial e para Preservar a Memória do que haviam sido os horrores dos campos de concentração, um Comité oficial de historiadores franceses encomendou a uma equipa dirigida por Alain Resnais um pequeno documentário (que dura cerca de meia hora) sobre aquele tema, a que se deu o título de Noite e Nevoeiro (Nuit er Brouillard no original). Tendo sido extremamente elogiado, tanto do ponto de vista da estética cinematográfica quanto do valor documental, o documentário também se tornou conhecido pelas controvérsias que desencadeou.
Uma delas referiu-se à sua participação no Festival de Cannes da Primavera de 1956, competição de onde foi discretamente retirado a pedido dos alemães. Numa época em que conviria exaltar a unidade europeia (o Tratado de Roma, fundador da CEE, viria a ser assinado dali a cerca de um ano - Março de 1957), tornava-se inoportuno realçar esses horrores de um passado (muito) próximo… Uma outra controvérsia, associada a uma imagem simbólica do documentário (acima), onde se pode identificar o típico quépi dos gendarmes (sinónimo do envolvimento oficial da França de Vichy no Holocausto), foi também discretamente rectificado (abaixo)…

26 janeiro 2011

A DEPURAÇÃO

Já aqui tive oportunidade de me referir neste blogue à Depuração (L´Épuration em francês) que em França se seguiu à sua libertação da ocupação alemã durante o segundo semestre de 1944. Mas a minha referência de então, intitulada A Verdadeira Puta era uma referência genérica e irónica à volubilidade das massas populares, sempre dispostas a manifestarem-se pelo vencedor do momento. Neste poste dedico-me mais à análise de algumas fotografias das vítimas (ou não…) desse processo que teve tanto de caótico quanto de arbitrário.
Comecemos por uma fotografia de Henri Cartier-Bresson que apanha o momento em que uma informadora dos alemães é denunciada perante a assistência de um desses tribunais ad-hoc que devem ter pululado pela França libertada naquela altura. Ter-se sido colaborador dos alemães (coloquialmente: collabo) tornara-se um estigma. Atente-se ao cuidado em ser inexpressivo por parte do Juiz que preside ao julgamento, contrastando com os ares triunfais da acusadora, de raiva e animosidade da assistência e, sobretudo, de resignação da acusada...
Nesta outra fotografia, também nos apercebemos de uma resignação apática na expressão da rapariga a quem cortam o cabelo, uma colaboradora acusada provavelmente daquilo que então se baptizou por colaboração na horizontal... O que parece marcar mais o conjunto á aquilo pode passar por um gesto atencioso do carrasco do lado direito (um FFI ou um FTP), que parece segurar delicadamente o queixo dela enquanto o barbeiro prossegue indiferente e metódico a sua tarefa de lhe rapar integralmente a cabeça…
Mas, como em tudo na vida, estas foram sanções reservadas para os comuns. As pessoas bem colocadas na vida, como a estilista Coco Chanel (acima, numa pose em que parece troçar das duas desgraçadas acima), cuja ligação sentimental a um oficial alemão era bem conhecida, foram poupadas a tais vexames, mesmo quando sujeitas a um Comité de Depuração. Porém, quem a protegeu (fala-se de Churchill...) também lhe recomendou que se fizesse esquecida, o que ela cumpriu passando os dez anos seguintes (1944-54) exilada na Suíça...

25 janeiro 2011

O QUE RIDICULARIZA UMA DEMOCRACIA

Em 28 de Fevereiro de 1986, quando regressava a casa vindo do cinema acompanhado de sua mulher, o Primeiro-Ministro sueco Olof Palme foi alvo de um atentado em plena rua por alguém que o alvejou a tiro. Palme só chegou ao hospital 45 minutos depois, onde já entrou cadáver. As investigações policiais que se sucederam, apesar das 300 pessoas envolvidas e dos dois anos de duração, também acabaram mal, sem que fosse encontrado qualquer suspeito viável. A questão do autor do assassinato do seu Primeiro-Ministro continua ainda hoje por resolver e permanece um embaraço da História da Suécia. Mas, 25 anos depois, o episódio tornou-se necessariamente algo acessório para a vida quotidiana da Suécia.
Este episódio passou-se numa daquelas democracias que costumamos apontar como de referência, e é nela que penso quando leio todos aqueles que parecem incomodar-se com o pretenso ridículo do interessante resultado eleitoral (4,5%) do candidato José Manuel Coelho¹ nas eleições presidenciais de anteontem. Esquecer-se-ão os incomodados que, também nessas democracias de referência e quando o eleitorado considera que as eleições não têm importância, também aparecem dessas candidaturas marginais a recolher resultados interessantes como foi o caso do Partido Pirata que recebeu 7,1% da votação (e elegeu um eurodeputado) nas últimas eleições europeias de Junho de 2009.
O que decididamente ridiculariza a democracia portuguesa quando em comparação com aquelas democracias de referência, comparando abordagens distintas ao assunto inicial do assassinato por resolver de um Primeiro-Ministro em exercício, é assistir-se a protagonistas e partidos nucleares do regime, como é o caso de Paulo Portas e do CDS, a proporem, 30 anos passados sobre os acontecimentos, a constituição de mais uma (a nona!!!) Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o acidente de Camarate… Esta, como outras atitudes de outros protagonistas centrais que se pretendem passar por sérios, é que se tornam ridículas. Não quem as denuncia, como o fez nesta campanha José Manuel Coelho.
¹ Nas suas declarações da noite eleitoral, não ouvi José Manuel Coelho agradecer-lhe mas Judite Sousa merecia-lhe um agradecimento especial pela forma como o (des)tratou na entrevista concedida à RTP. O povo sempre adorou enredos com vítimas (ele) e megeras (ela)…

24 janeiro 2011

AO VIVO...

Acima, temos o vídeo de uma actuação dos Queen no Estádio de Wembley em 1986, com Freddie Mercury a interpretar Love of my Live em associação com um público que lhe está visivelmente rendido. Mas nem sempre as coisas correm assim, e esse pequeno preâmbulo audiovisual destina-se a destacar – pelo contraste – o verdadeiro objectivo do poste, a fotografia abaixo, da autoria do fotógrafo Bob Gruen, conseguida durante um outro grandioso espectáculo ao vivo, onde o vocalista não terá apanhado tão bem a audiência, tal a profusão de calçado espalhado pelo palco…

VOTO EM BRANCO – O PROTESTO MANSO E DISCRETO

No dia seguinte a umas eleições presidenciais haverá certamente, dispersa pelos órgãos de comunicação social tradicional, e por aqueles blogues que com eles ainda pretendem rivalizar, uma pletora de análises a respeito dos resultados eleitorais de ontem. Aqui apenas desejo mostrar a atenção para um fenómeno que a experiência tem tornado cada vez mais óbvio: como os votos de protesto têm que ser expressos com a maior visibilidade possível (um voto de protesto só tem utilidade dessa forma), conclui-se que a atitude correcta é votar e concentrar a votação na candidatura mais desalinhada que concorra ao acto eleitoral. Ontem, essa candidatura era a de José Manuel Coelho.
A lógica da estupidificação da transmissão da mensagem praticada pelos órgãos de comunicação social a isso obriga. A capa da edição de hoje do jornal Público (acima) demonstra-o integralmente. Nela aparece em lugar de destaque os 4,5% (equivalente a 189.000 votos) recebidos por José Manuel Coelho. Porém, o resultado obtido por aquele candidato é sensivelmente idêntico ao número de votos em branco contados (191.000)... Sobre esses parece não existir qualquer referência na página inicial. Nem a esses, nem aos votos nulos (86.000) que, estranhamente, duplicaram em relação aos dois últimos actos eleitorais, como se tivesse havido uma regressão no analfabetismo eleitoral…

23 janeiro 2011

O TRONO

Assumindo a impropriedade de se escrever hoje, dia de eleições presidenciais, sobre as mesmas, e simultaneamente elevando e rebaixando o nível de um poste que esteja, ainda que remotamente, associado à questão da chefia do Estado, no primeiro caso, o da elevação, porque o assunto poderá ser encarado como uma abordagem à questão do nosso regime (republicano ou monárquico), no segundo caso, o do rebaixamento, porque o assunto também pode ser encarado como uma abordagem fútil às nossas prosaicas necessidades fisiológicas, tenho o gosto de vos apresentar uma síntese do tema, em fotografia: o Trono, literalmente...

22 janeiro 2011

S & D

(O poste é para ser lido ao som dos Buffalo Springfield: For What It's Worth)

A Guerra do Vietname foi fotografada milhares de vezes. Desses milhares de imagens resultaram talvez uma dúzia de fotografias que se tornaram icónicas. Algumas delas já aqui mostrei no blogue, mas faltava-me aquela que, não se contando entre as mais famosas, é aquela que considero melhor descrever a Guerra do Vietname, numa conjugação feliz entre a forma como as operações eram conduzidas no terreno e também como metáfora da forma como o envolvimento norte-americano no Vietname foi sendo gerido politicamente. Não sei quem é o autor mas baptizei a fotografia de S & D. S & D é a abreviatura de Search and Destroy (que se traduz por Busca e Destruição), o nome com que o comando norte-americano baptizou o processo com que pretendeu conduzir as operações de contra-guerrilha.

Unidades de infantaria partiam em patrulhamento para a selva nos locais onde se sabia que o inimigo (Vietcong) se havia refugiado para o encontrarem e o destruírem com o seu superior poder de fogo. Frequentemente, faltavam aos soldados norte-americanos não só a rusticidade como sobretudo a capacidade de sofrimento para enfrentarem em pé de igualdade com os guerrilheiros que perseguiam as condições adversas do terreno e clima vietnamitas. Este instantâneo de um grupo de combate que se enfiou penosamente pelo meio de uma área alagada sob uma pesada chuva tropical mostra isso e não só… O formato curvo da coluna parece indicar que quem a dirigia não tinha ideia alguma para que sítio da outra margem se dirigiria, numa metáfora perfeita do envolvimento norte-americano na questão vietnamita…

21 janeiro 2011

ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS

Vale a pena deixar escrito em antecipação que é muito improvável que as próximas eleições de Domingo possam alterar grande coisa, nomeadamente quem vai ser o ocupante do Palácio de Belém no próximo quinquénio. No regime democrático, parece já se ter desenvolvido uma tradição que os eleitos cumprem sempre os dois mandatos e que estas eleições intercalares não são para se disputar a sério, apenas para reconduzir o Presidente em exercício. Aliás, já o actual titular do cargo actuou segundo essa lógica, ao apresentar-se (e ser derrotado) em 1996 e prescindindo das intercalares de 2001, para só se reapresentar (e vencer) as eleições a sério que se seguiram, em 2006.

Olhando para trás, se a reeleição de Eanes em 1980 foi disputada por ter sido a primeira, já a de Soares em 1991 foi vencida por falta de comparência de uma personalidade credível de Direita e mesmo uma personalidade tão medíocre quanto Sampaio conseguiu desenvencilhar-se facilmente face a outra de igual jaez (Ferreira do Amaral) em 2001. Constatado este padrão e como Cavaco fez nesse último caso, é normal que as verdadeiras ambições para ocupar o cargo presidencial se guardem para as próximas eleições a sério em 2016. O que quer dizer que os nomes que leremos no boletim de voto no próximo Domingo não serão a nata dos portugueses que ambicionam ocupar o cargo¹
Por outro lado, as eleições presidenciais, podendo ser discutidas em uma ou duas voltas, têm a possibilidade de ser encaradas na primeira com a ligeireza de uma fase preliminar para a seriedade. É famoso o exemplo francês de 2002 (também uma reeleição…), em que a votação em candidatos que representavam agendas específicas (havia 16 candidatos no total, apenas um deles ficou abaixo de 1% dos votos) custou ao socialista Lionel Jospin a comparência na segunda volta em detrimento de Jean-Marie Le Pen. Ora esta eleição presidencial de 2011, sendo uma espécie de formalidade, presta-se a essas brincadeiras. E a grande revelação como brincalhão desta campanha é José Manuel Coelho

Excluída à partida a hipótese de considerar seriamente as candidaturas de Cavaco Silva ou de Manuel Alegre e posteriormente a de Fernando Nobre (que proposta é aquela dos 100 deputados²?...) cheguei à conclusão que o discurso que fazia mais sentido era, paradoxalmente, o da aparente falta de senso do candidato madeirense. Em Corrida para Oklahoma, uma história de BD de Lucky Luke, há uma candidatura de um idiota bem intencionado chamado Dopey (abaixo) que acaba por vencer as eleições. No nosso caso, nem Coelho é idiota, nem ele terá hipóteses de vencer as eleições, mas o cenário construído à volta delas também me suscita este voto visível de protesto.
¹ Havendo vontade política, esta questão das eleições intercalares pode ser resolvida eliminando a possibilidade do Presidente eleito se apresentar à reeleição. Colateralmente, isso também resolveria a questão, frequentemente discutida, da diferente conduta dos presidentes durante o seu primeiro (quando procuram a reeleição) e segundo mandatos.
² Em que países da União Europeia é que Fernando Nobre encontrou o rácio de um deputado para 100.000 habitantes? Não se terá ele esquecido que nesses países os Parlamentos são bicamerais e não unicamerais como o nosso?

ESPELHO MEU, ESPELHO MEU…

O neste momento incontornável insucesso da candidatura de Manuel Alegre (…) É com estas palavras que Vital Moreira começa um dos postes recentes no seu blogue a respeito da actual campanha para as eleições presidenciais. É pena que não o tenha lido naquele mesmo lugar fazer uma análise igualmente lúcida por ocasião da campanha para as eleições europeias cuja lista do PS encabeçou...

Há dezoito meses atrás, recorde-se, nem mesmo depois das eleições Vital Moreira assumiu o incontornável insucesso da sua candidatura quando se limitou a escrever: A democracia é assim: há ganhar e perder. Desta vez, coube-nos a derrota. Parabéns aos vencedores. As rosas até são umas flores bem bonitas mas de que serve a sua beleza quando se reflectem em espelhos partidos?...

20 janeiro 2011

SOBRE A UTILIDADE E A ESTÉTICA DOS ESCALOPES APLICADOS SOBRE OLHOS PISADOS

Há imensos aspectos intrigantes associados aos olhos pisados. Por exemplo: qual é a explicação para que, entre nós, os designemos por olhos à belenenses? Ou então, que associação gastronómica fizeram em França para que os designem por olhos em molho de manteiga¹? Sobretudo, qual a fundamentação científica da terapêutica da aplicação local de um escalope de carne crua?
Quanto a esta última dúvida, de uma investigação rápida que fiz pela internet fiquei com a informação que os efeitos benéficos resultam da baixa temperatura daquilo que for aplicado directamente sobre o inchaço (o gelo é sempre preferível…) e que o efeito da carne crua, muito mais a questão da qualidade da carne que for aplicada, se trata apenas de mais um daqueles mitos urbanos
Excluída a razão médica, vale a pena olhar com ar apreciador para a fotografia inicial conjuntamente com esta derradeira, para perceber que há também quem considere que existe um certo impacto estético na imagem de alguém com um bife cru colado à cara. Trata-se de uma beleza que me escapa, mas esse é apenas mais outro dos aspectos intrigantes associados aos olhos pisados…
¹ Oeil au beurre noir no original, sendo beurre noir um molho de manteiga que tem esta receita.

19 janeiro 2011

JOAN CRAWFORD

A interpretação de Joan Crawford é uma de múltiplas razões porque nunca gostei de Johnny Guitar, sobretudo daquela forma excessivamente elogiosa como o filme costuma ser comentado. Joan Crawford limita-se a fazer de Joan Crawford que no filme tem o nome de Vienna, ou seja, qualquer delas é uma cabra da pior espécie, conforme as opiniões de quem com ela contracenou naquele (Mercedes McCambridge, Sterling Hayden) ou noutros filmes ao longo da sua carreira.
Outro dia escrevi aqui sobre rivalidades entre actrizes em cerimónias de atribuição de Óscares. Dois episódios a esse mesmo respeito envolvendo Joan Crawford dizem tudo sobre ela. Nomeada em 1946, mas não querendo passar pela provação da hipotética derrota fez-se passar por doente e representar na cerimónia pelo seu cabeleireiro. Mas Joan Crawford ganhou e, subitamente refeita, engendrou uma mini-cerimónia (acima) na cama do hospital nessa mesma noite…
Dezassete anos depois, por ocasião da cerimónia de 1963, Joan Crawford conseguiu a proeza especial de aparecer na fotografia dos vencedores dos Óscares daquele ano (acima) sem sequer ter sido sequer nomeada para algum… Aconteceu porque a vencedora daquele ano (Anne Bancroft) não estava presente na cerimónia e Joan dispôs-se generosamente a recebê-lo em seu lugar. A presença na fotografia protocolar dos vencedores é que ultrapassará a generosidade...
Eve Arnold havia-se tornado a fotógrafa favorita de Crawford, embora a actriz, envelhecendo, saísse desfavorecida de algumas fotografias, exibindo uma elegância feita de cintas apertadas comprimindo carnes flácidas (acima). Mas há uma fotografia sua de Joan Crawford que é ímpar, justapondo a actriz aos 54 anos com o quadro de parede de como ela desejaria ser para sempre, mostrando como o crepúsculo pode ser impiedoso, para actrizes bondosas e para as outras

18 janeiro 2011

A ALEMANHA E A EUROPA

Neste blogue não se é muito dado a efemérides, mas excepcionalmente assinala-se que a 18 de Janeiro de 1871 foi proclamada a reunificação alemã na Sala dos Espelhos do Palácio de Versalhes, cerimónia que foi (posteriormente) perpetuada através do quadro abaixo. Se ainda há três meses festejámos o centenário da República em Portugal, vale a pena fazer contas e perceber que a unidade alemã através da constituição do Segundo Reich não é substancialmente muito mais antiga: precisamente 140 anos.
E não foi por acaso que o autor do quadro (Anton von Werner) preferiu que Otto von Bismarck (o senhor de branco no centro do quadro) se destacasse mais do que o próprio monarca que está ali a ser proclamado como Kaiser da Alemanha – Guilherme I. Afinal fora ele que politicamente arriscara para que se chegasse àquele desfecho. Com a actual crise e com a descendente de Otto, Angela (abaixo), é que, percebendo-se a sua aversão pelo risco, não se consegue perceber a que desfecho actualmente ela pretende chegar…
Porque, depois de anos a fio a desconfiarmos de uma estratégia alemã para se tornar no poder hegemónico europeu, é altura de nos perguntarmos se existe coragem de a implementar

17 janeiro 2011

AINDA OS PENTEADOS «BLACK POWER» e O.J. SIMPSON

Ainda a propósito hairstyle que imortalizou Angela Davis, vale a pena lembrar como esse estilo veio perturbar as relações de sã convivência social no cinema. Quem se sentasse atrás de qualquer orgulhoso detentor de um penteado daqueles poder-se-ia considerar um desgraçado porque garantidamente não iria conseguir ver o filme!...
Terá sido por isso que foi também durante um filme – um dos da série The Naked Gun – que eu assisti à mais exuberante paródia aos penteados afro (vulgo blacks), quando O.J. Simpson aparece com um de tal forma descomunal (acima) que nem consegue caber na porta…
E, passando das fotografias dos blacks para as de O.J. Simpson, observe-se este instantâneo da autoria de Andy Warhol, obtido nessa mesma época em que Simpson ainda gozava de uma imagem pública muito favorável, fotografia esta que os acontecimentos posteriores vieram a transformar num exemplo de presciência…

DOIS CUS

A fotografia é da nova-iorquina Jill Freedman e, como uma fotografia bem conseguida, está lá sugerida toda uma história de dois protagonistas que se cruza por um instante, o da detenção da prostituta, com as suas mãos em cima do tejadilho como lhe ordenaram, identificável por aquelas calças de Lycra (?) tão justas quanto brilhantes. Ao mesmo tempo, um polícia revista-lhe o carro à procura de droga, num interior que se adivinha já fosse uma bagunça mesmo antes da revista… A postura do meio corpo visível do polícia, meio enferrujada, sugere um agente de meia-idade combinando a negligência – repare-se na forma como deixa a sua arma no coldre ao alcance da detida – com a tarimba – as prostitutas detidas não costumam fazer disparates desses...

16 janeiro 2011

REVOLUCIONÁRIOS ATÉ À PONTA DOS CABELOS

Depois de Martin Luther King e de Malcolm X, a evolução do posicionamento político das organizações afro-americanas que lutavam pelos direitos cívicos veio a radicalizar-se ainda mais. Organizações como o Partido das Panteras Negras adoptaram atitudes agressivas (acima), ideologias radicais (marxismo-leninismo, maoismo) e uma designação tão apelativa que bem poderia ter pensada pelos criativos do Marketing de uma grande corporação…
Mais, não só Panteras Negras era uma designação feliz, que chamava facilmente a atenção, como a face da organização junto dos média tinha uma imagem cativante. Angela Davis era uma mulata bonita com menos de 30 anos, facilmente identificável por um penteado com um estilo inconfundível: o estilo black power (acima). J. Edgar Hoover e o seu FBI fizeram muito pela sua notoriedade quando a colocaram na lista dos 10 Mais Procurados
Como muitas organizações radicais norte-americanas de então (veja-se o caso da SDSEstudantes por uma Sociedade Democrática), também os Panteras Negras se notabilizavam pela heterogeneidade ideológica dos seus membros que se procuravam ultrapassar uns aos outros em radicalismo com os seus discursos. Verdadeiramente perigosas eram apenas as facções radicais (como os Weatherman nos SDS) que optaram pela luta armada
Não ficou provado que Angela Davis tenha enveredado por essa via, como pretendia o FBI. Capturada em Outubro 1970, por causa de um assalto a um Tribunal que causou quatro mortos incluindo um Juiz, a prisão de Angela provocou manifestações de solidariedade (acima) e a atenção dos média (abaixo), tendo vindo a ser absolvida em 1972. De tudo o que aconteceu, o que parece ter perdurado para a História, foi mesmo o estilo do penteado