Tão forte era a tradição hereditária na sucessão dos cargos políticos na Europa do século XVII, que, por morte do Lorde Protector inglês Oliver Cromwell em 1658, os dirigentes do regime escolheram o seu filho Ricardo Cromwell para lhe suceder. Como seria provável, correu mal: o regime só funcionava se o seu principal titular e o depositário dos verdadeiros instrumentos de poder (neste caso, o exército que vencera a guerra civil) fosse o mesmo. O fraco Ricardo foi apeado.
E que tal regressar ao modelo monárquico clássico, desde que o novo rei não se comece a levar demasiado a sério? Trata-se de uma simplificação, mas uma boa parte do racional que esteve por detrás da Restauração do trono britânico em 1660, assemelhou-se a esse raciocínio. O novo soberano, filho do decapitado Carlos I (1600-1649), era o seu filho Carlos II (1630-1685), que na altura tinha trinta anos, uma idade ainda jovem, mas onde já fora ultrapassada a fase do idealismo imaturo.
E que tal regressar ao modelo monárquico clássico, desde que o novo rei não se comece a levar demasiado a sério? Trata-se de uma simplificação, mas uma boa parte do racional que esteve por detrás da Restauração do trono britânico em 1660, assemelhou-se a esse raciocínio. O novo soberano, filho do decapitado Carlos I (1600-1649), era o seu filho Carlos II (1630-1685), que na altura tinha trinta anos, uma idade ainda jovem, mas onde já fora ultrapassada a fase do idealismo imaturo.

Encarado nesta perspectiva, Carlos II é capaz de ter sido um dos reis que mais se assemelhe aos políticos actuais da boa tradição norte-americana, cheios de charme pessoal, astutos mas não muito inteligentes nem particularmente cultivados. É preciso prometer ou fazer uma proclamação? Então faça-se, depois se vê. O seu discurso ao Parlamento, no dia da sua entrada em Londres é um exemplo disso, embora não seja desprovido daquele travo de simpatia que conquista votos:

E o melhor era que, se o discurso tivesse passado na televisão, Carlos teria sido credível para o auditório da Sky* (que, naquela altura, também ainda não comprava o The Sun*…) porque era genuíno quando proferia estas afirmações. Carlos II era um sujeito superficial mas bem disposto, propenso a divertir-se e a criar uma moda dessas num país muito necessitado dela, depois de uma guerra civil e de um decénio sob a tutela de puritanos religiosos, conhecidos pela sua falta de espírito de humor.
A arma secreta de Carlos II era o encanto pessoal. Um dos aspectos que pode comprovar a eficácia da arma (conjuntamente com a sua inconstância) é a extensa lista das suas amantes (dúzia e meia, considerando apenas as oficiais). Também era um procriador competente: conhecem-se uma vintena de filhos ilegítimos. Mas, já no século XVII, havia portugueses (além do Mourinho e do Cristiano Ronaldo...) que participaram de forma decisiva na evolução da história britânica...
É que nenhum dos filhos de Carlos foi legítimo, ou seja, resultante do casamento de Carlos II com a rainha, a portuguesa Catarina de Bragança (haviam casado em 1662), o que fez com que o trono passasse para o irmão de Carlos, Jaime II, com as consequências que veremos mais adiante. E poderá ser excessivo, mas não deixará de ser verdadeiro, considerar que uma boa parte das ambições de Carlos II se haviam esgotado no dia da cerimónia da sua coroação (abaixo - a nova coroa, que teve de ser reconstruída).

As reconstruções históricas posteriores, que dão grande significado ao dote de Catarina de Bragança, composto pelas praças portuguesas de Tânger e Bombaim, em que a segunda esteve na base da construção do Império Britânico das Índias, são uma grande estória… A verdade crua é que a monarquia portuguesa (recentemente restaurada – 1640 – como a britânica) não tinha dinheiro para mandar cantar um cego nem para dotes e conseguiu substituiu-lo por praças fortes…
Quanto à utilidade de Tânger, ela tornou-se eloquente com a decisão britânica de evacuar o donativo, 23 anos apenas depois de o terem recebido… Bombaim sempre devia render qualquer coisa (foi alugada à Companhia das Índias Orientais…) mas a opinião de Carlos sobre o valor de praças fortes, mesmo de interesse estratégico, pode-se ver pela facilidade com que Carlos vendeu a de Dunquerque a Luís XIV de França, logo em 1662, para resolver os seus problemas de tesouraria…

Carlos II, além de verdadeiro antepassado inspirador da figura distinta do gentleman britânico, é capaz de dever a sua sobrevivência política à percepção por parte dos verdadeiros actores do jogo (a nobreza britânica, Luís XIV, os interesses comerciais de holandeses e britânicos) das suas fraquezas e da convicção (errada) de quão fácil ele podia ser manipulado. Carlos morreu aos 55 anos e, não deixando descendência legítima, teve como sucessor (abaixo, à direita) seu irmão Jaime II (1633-1701).

Durante os próximos 73 anos, desde o reinado do holandês Guilherme III (1689-1702) até à coroação de Jorge III em 1761, a Grã-Bretanha e a Irlanda não voltaram a possuir um monarca que estivesse verdadeiramente interessado em governar pessoalmente os seus reinos. Assim começava a ascensão da importância do cargo de primeiro-ministro…
* A Sky é uma emissora de televisão e o The Sun um jornal, ambos conhecidos pelos seus conteúdos dirigidos ao segmento popular. São o equivalente britânico da TVI e do Correio da Manhã ou o 24 Horas.
** A Segunda e a Terceira Guerras Anglo-Holandesas (1665-67 e 1672-74).
*** Carlos II também se converteu, mas, típico nele, apenas quando estava a morrer…
Entre dotes, compra e venda de "praças fortes", já seria tempo de vender Olivença à Espanha!
ResponderEliminarLegalidade acima de tudo!