Ao contrário do que acontecera com Yalta, a Conferência de Potsdam, que decorreu durante a segunda quinzena de Julho de 1945 (há precisamente 62 anos atrás), já teve lugar dois meses passados depois da vitória aliada no fim da Segunda Guerra Mundial na Europa. O local de encontro escolhido para o encontro carregava o simbolismo de se situar nos arredores da capital dos vencidos – Berlim.
Outros factores também contavam na apreciação favorável de Estaline: Potsdam estava sob controlo do Exército Vermelho e era um local onde ele podia chegar de comboio… O sempre solícito Beria precisava, num relatório que enviara antecipadamente para Estaline: o percurso ferroviário seria de 1.923 km, dos quais 1.095 km na União Soviética, 594 na Polónia e 234 na Alemanha.
Não se sabe é que fronteiras terá usado Beria para atribuir nacionalidades ao percurso ferroviário, pois o tema do traçado dessas fronteiras era um dos que viria a estar em cima da mesa para discussão, muito embora Estaline já tivesse uma ideia bem precisa do que queria. Também os seus dois aliados ocidentais também tinham uma ideia muito aproximada do que ele iria exigir… e do que iriam conceder…
O lugar escolhido para a Conferência seria o Palácio Cecilienhof, mandado construir em plena Primeira Guerra Mundial (1914-17) pelo último Kaiser, Guilherme II, destinado ao seu filho Guilherme e, sobretudo, à sua nora Cecília de Mecklenburg-Schwerin, a quem o Palácio fora buscar o nome, pois o príncipe herdeiro tinha sido mobilizado para assumir o comando de um dos exércitos imperiais na frente ocidental, em França.
As preocupações logísticas dos soviéticos para esta Conferência eram muito menores do que haviam sido as de Yalta. Finda a guerra, e havendo ficado estabelecido o acordo de princípio que a cidade de Berlim ficaria dividida em sectores de ocupação distintos para cada um dos aliados, ficou subentendido que seria por conta dos dois parceiros anglo-saxónicos a responsabilidade do abastecimento das suas comitivas.
Caso distinto era a questão da segurança dos conferencistas, numa região da Alemanha onde a responsabilidade pertencia inequivocamente aos soviéticos e numa época onde ainda não era de excluir o cenário de um golpe de mão espectacular suicida perpetrado por fanáticos nazis: sete regimentos de tropas do NKVD foram destacados para o efeito alem de vários destacamentos do Exército Vermelho.
Mas a confiança não imperava, como se deduz do relatório prévio de Beria, que específica que as forças do NKVD tinham vindo de Moscovo, iriam operar num dispositivo de três círculos de segurança concêntricos e iriam ser comandadas pelo general (do NKVD) Sergei Kruglov (um homem de toda a confiança, já responsável pela segurança em Teerão*). Além disso, havia dois aeródromos de prevenção…
Mas, mesmo só preocupados com a delegação soviética, as medidas adoptadas pelo NKVD para o apoio logístico do evento foram um excesso, só explicável pela desforra de terem lugar numa Alemanha recém vencida. Foram requisitadas (e desalojados os respectivos moradores…) 63 moradias, incluindo uma moradia maior de 15 assoalhadas, 400 m² e uma grande varanda e jardim, especialmente para Estaline.
A moradia escolhida para Molotov** era, obviamente, um pouco mais pequena: só tinha onze assoalhadas, e não fora equipada com o enorme centro de comunicações que permitia a Estaline estar em contacto imediato com Moscovo e com as diversas Frentes de Exércitos na Europa e no Extremo Oriente. Com quase uma vivenda por conferencista estava-se muito longe dos 16 a 20 oficiais por camarata de Yalta…
Além dos tradicionais suprimentos alimentares para a confecção das refeições que viessem a ser oferecidas pela delegação soviética, o NKVD encarregara-se de trazer gado vivo, construir aviários, e construir depósitos de vegetais e bebidas em quintas próximas, nos arredores de Potsdam, para evitar qualquer eventualidade de ruptura de stocks. Duas padarias de campanha estavam também afectas ao serviço dos conferencistas.
Em relação às presenças de Yalta, um dos líderes de delegação havia mudado: Harry Truman tornara-se o novo presidente dos Estados Unidos, depois da morte súbita de Franklin D. Roosevelt em Abril de 1945. E durante a Conferência, a titularidade de outro dos líderes também estava em jogo: a 5 de Julho haviam decorrido eleições gerais no Reino Unido e o escrutínio ainda estava em curso.
Como o sistema eleitoral britânico elege deputados por círculos uninominais, os votos precisam de ser contados no círculo de residência do eleitor o que, com quase cinco milhões de eleitores mobilizados e dispersos, a cumprir serviço nas forças armadas ou requisitados para serviços cívicos, ou no estrangeiro, tornava o voto por correspondência numa fracção apreciável da votação total. E havia que esperar que essas cartas chegassem.
Entretanto, prevendo as duas eventualidades, Clement Attlee, o líder do Partido Trabalhista e natural indigitado para o cargo de primeiro-ministro em caso de vitória do seu partido, acompanhara Winston Churchill e era mantido ao corrente de tudo o que de relevante se passava – creio que é possível identificá-lo pela careca, sentado em frente, dois lugares à direita de Churchill na fotografia da grande mesa de reuniões (abaixo).
O Partido Trabalhista ganhou folgadamente (49,7%) as eleições (os resultados saíram a 26 de Julho de 1945) e foi Clement Attlee que ficou a assumir a direcção da delegação britânica e que veio a figurar a partir daí nas fotografias das cerimónias da Conferência. Do grupo original já só restava Estaline. Sem a deficiência de Roosevelt, agora já se podia tirar fotografias institucionais onde os líderes aparecessem de pé…
Estaline, por sua vez, como agradecimento pela sabedoria demonstrada com a sua vitória na Grande Guerra Patriótica (assim chamam os soviéticos à Segunda Guerra Mundial) fora promovido em Junho ao novo posto de Generalíssimo, para o distinguir da proliferação de Marechais que a guerra produzira. As fotografias mostram-no com o seu novo uniforme, casaco claro e calças listadas, correspondente ao seu novo posto.
Consta que quando lho mostraram inicialmente, Estaline mandou bugiar os proponentes, perguntando se eles queriam que ele parecesse um porteiro de um restaurante de luxo… Foi um prodígio da persuasão socialista, simbólico do ambiente que se vivia no Kremlin, que a corte que o rodeava o convencesse como ele estava enganado. Dessa vez é que Estaline devia ter sido mais desconfiado… porque é isso mesmo que ele parece!...
Agora quanto à história da Conferência? Isso é outra História…
* Conferência ocorrida em 1943.
** Vyacheslav Molotov, Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Outros factores também contavam na apreciação favorável de Estaline: Potsdam estava sob controlo do Exército Vermelho e era um local onde ele podia chegar de comboio… O sempre solícito Beria precisava, num relatório que enviara antecipadamente para Estaline: o percurso ferroviário seria de 1.923 km, dos quais 1.095 km na União Soviética, 594 na Polónia e 234 na Alemanha.
Não se sabe é que fronteiras terá usado Beria para atribuir nacionalidades ao percurso ferroviário, pois o tema do traçado dessas fronteiras era um dos que viria a estar em cima da mesa para discussão, muito embora Estaline já tivesse uma ideia bem precisa do que queria. Também os seus dois aliados ocidentais também tinham uma ideia muito aproximada do que ele iria exigir… e do que iriam conceder…
O lugar escolhido para a Conferência seria o Palácio Cecilienhof, mandado construir em plena Primeira Guerra Mundial (1914-17) pelo último Kaiser, Guilherme II, destinado ao seu filho Guilherme e, sobretudo, à sua nora Cecília de Mecklenburg-Schwerin, a quem o Palácio fora buscar o nome, pois o príncipe herdeiro tinha sido mobilizado para assumir o comando de um dos exércitos imperiais na frente ocidental, em França.
As preocupações logísticas dos soviéticos para esta Conferência eram muito menores do que haviam sido as de Yalta. Finda a guerra, e havendo ficado estabelecido o acordo de princípio que a cidade de Berlim ficaria dividida em sectores de ocupação distintos para cada um dos aliados, ficou subentendido que seria por conta dos dois parceiros anglo-saxónicos a responsabilidade do abastecimento das suas comitivas.
Caso distinto era a questão da segurança dos conferencistas, numa região da Alemanha onde a responsabilidade pertencia inequivocamente aos soviéticos e numa época onde ainda não era de excluir o cenário de um golpe de mão espectacular suicida perpetrado por fanáticos nazis: sete regimentos de tropas do NKVD foram destacados para o efeito alem de vários destacamentos do Exército Vermelho.
Mas a confiança não imperava, como se deduz do relatório prévio de Beria, que específica que as forças do NKVD tinham vindo de Moscovo, iriam operar num dispositivo de três círculos de segurança concêntricos e iriam ser comandadas pelo general (do NKVD) Sergei Kruglov (um homem de toda a confiança, já responsável pela segurança em Teerão*). Além disso, havia dois aeródromos de prevenção…
Mas, mesmo só preocupados com a delegação soviética, as medidas adoptadas pelo NKVD para o apoio logístico do evento foram um excesso, só explicável pela desforra de terem lugar numa Alemanha recém vencida. Foram requisitadas (e desalojados os respectivos moradores…) 63 moradias, incluindo uma moradia maior de 15 assoalhadas, 400 m² e uma grande varanda e jardim, especialmente para Estaline.
A moradia escolhida para Molotov** era, obviamente, um pouco mais pequena: só tinha onze assoalhadas, e não fora equipada com o enorme centro de comunicações que permitia a Estaline estar em contacto imediato com Moscovo e com as diversas Frentes de Exércitos na Europa e no Extremo Oriente. Com quase uma vivenda por conferencista estava-se muito longe dos 16 a 20 oficiais por camarata de Yalta…
Além dos tradicionais suprimentos alimentares para a confecção das refeições que viessem a ser oferecidas pela delegação soviética, o NKVD encarregara-se de trazer gado vivo, construir aviários, e construir depósitos de vegetais e bebidas em quintas próximas, nos arredores de Potsdam, para evitar qualquer eventualidade de ruptura de stocks. Duas padarias de campanha estavam também afectas ao serviço dos conferencistas.
Em relação às presenças de Yalta, um dos líderes de delegação havia mudado: Harry Truman tornara-se o novo presidente dos Estados Unidos, depois da morte súbita de Franklin D. Roosevelt em Abril de 1945. E durante a Conferência, a titularidade de outro dos líderes também estava em jogo: a 5 de Julho haviam decorrido eleições gerais no Reino Unido e o escrutínio ainda estava em curso.
Como o sistema eleitoral britânico elege deputados por círculos uninominais, os votos precisam de ser contados no círculo de residência do eleitor o que, com quase cinco milhões de eleitores mobilizados e dispersos, a cumprir serviço nas forças armadas ou requisitados para serviços cívicos, ou no estrangeiro, tornava o voto por correspondência numa fracção apreciável da votação total. E havia que esperar que essas cartas chegassem.
Entretanto, prevendo as duas eventualidades, Clement Attlee, o líder do Partido Trabalhista e natural indigitado para o cargo de primeiro-ministro em caso de vitória do seu partido, acompanhara Winston Churchill e era mantido ao corrente de tudo o que de relevante se passava – creio que é possível identificá-lo pela careca, sentado em frente, dois lugares à direita de Churchill na fotografia da grande mesa de reuniões (abaixo).
O Partido Trabalhista ganhou folgadamente (49,7%) as eleições (os resultados saíram a 26 de Julho de 1945) e foi Clement Attlee que ficou a assumir a direcção da delegação britânica e que veio a figurar a partir daí nas fotografias das cerimónias da Conferência. Do grupo original já só restava Estaline. Sem a deficiência de Roosevelt, agora já se podia tirar fotografias institucionais onde os líderes aparecessem de pé…
Estaline, por sua vez, como agradecimento pela sabedoria demonstrada com a sua vitória na Grande Guerra Patriótica (assim chamam os soviéticos à Segunda Guerra Mundial) fora promovido em Junho ao novo posto de Generalíssimo, para o distinguir da proliferação de Marechais que a guerra produzira. As fotografias mostram-no com o seu novo uniforme, casaco claro e calças listadas, correspondente ao seu novo posto.
Consta que quando lho mostraram inicialmente, Estaline mandou bugiar os proponentes, perguntando se eles queriam que ele parecesse um porteiro de um restaurante de luxo… Foi um prodígio da persuasão socialista, simbólico do ambiente que se vivia no Kremlin, que a corte que o rodeava o convencesse como ele estava enganado. Dessa vez é que Estaline devia ter sido mais desconfiado… porque é isso mesmo que ele parece!...
Agora quanto à história da Conferência? Isso é outra História…
* Conferência ocorrida em 1943.
** Vyacheslav Molotov, Ministro dos Negócios Estrangeiros.
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