O que é bom nas recordações de infância é que elas são muito feitas de sensações e assim fáceis de reviver. Torna-as confortáveis de sentir e de compartilhar com quem também as sentiu connosco mas também as torna mais difíceis de transmitir quando isso não acontece. Esta é uma pequena história dessas, uma história de um longínquo Verão, no final dos anos sessenta (1967, 1968?), quando os turistas estrangeiros de mochila às costas no Algarve ainda eram uma raridade e o domínio da língua inglesa por parte dos portugueses outra.

Estabelecida a comunicação, satisfeitos pela descoberta de alguém com quem se podiam entender, a conversa dos austríacos com a família prolongou-se (mas com o pai a intérprete e gesticulador mor) até que se chegou à pergunta de onde vinham os turistas:
– Áustria – apontando na direcção do Nordeste, mostrando que haviam assimilado bem os pontos cardeais.
E o puto, para aí com uns 6 anos, que até ali permanecera calado sem perceber patavina da conversa, reagindo pela primeira vez a uns sons que lhe pareciam vagamente familiares:
– Austrália!
– Áustria! – reagiu em uníssono o casal, corrigindo rapidamente a confusão que deve ser muito frequente.
– Austrália! – continuou o puto, contente por lhe prestarem atenção.
– Áustria! – e o puto parecia que se animava ainda mais, como se a veemência em o corrigir fosse sinónimo da sua importância…
– Austrália!
Da última vez a coligação contra ele era poderosa, incluindo o próprio pai: – Áustria! E o puto lá se calou de vez…
Testemunha dos acontecimentos, à primeira pensei que o puto era ignorante, à segunda que o puto era parvo, só à terceira percebi que o puto estava era deliciado com a atenção que provocara… Era um precoce daqueles que dizem não importa o quê desde que lhes prestem atenção… E repetir Austrália sempre que se pronunciava Áustria estava a dar cá um efeito! Até os austríacos - que só falavam estrangeiro - lhe davam troco...

Outra vez a meter-se com o pequenino? Enxergue-se e leia umas coisinhas!
ResponderEliminar;D
Rantas, este João, embora costume apresentar raciocínios originais de uma simplicidade infantil (que estiveram todo este tempo à espera dele para que ele os pensasse…), não é o João dos pequeninos, é outro João.
ResponderEliminarSempre em leituras!... Um abraço.
A.Teixeira