24 maio 2020

OS CAMARADAS DA SEITA RELIGIOSA

24 de Maio de 1990. Num artigo de opinião publicado no semanário Tempo (jornal que irá deixar de se publicar no final daquele ano), o autor compara o comportamento dos comunistas a uma fé fanática e considera o ambiente vivido no PCP como sendo ainda mais retrógrado e menos adaptável às novas circunstâncias do que o da igreja católica. A associação entre o comunismo e uma forma de vivência religiosa, mais do que político-social, não é, como se vê, nada original e tem muitos anos - no caso, comprovadamente trinta. E, no entanto, ainda hoje, os visados (comunistas), cada vez que são menorizados por tal subserviência, assumem um comportamento ultrajado como se nunca tivessem ouvido falar de tal analogia.

5 comentários:

  1. De vez em quando, volto a visitar este blogue, mas logo encontro posts como este e percebo por que razão não vale a pena tornar a pôr aqui os pés, ou melhor, as mãos, pois uso tablet.
    A associação entre o comunismo (que raio é isso, já agora, quando há tantas formulações teóricas, desde as mais sistemáticas às mais abertas, desde as mais ortodoxas às mais críticas?) e preconcenceitos religiosos é bem antiga. A suspeita de messianismo na visão da história do materialismo dialéctico remonta à própria origem do marxismo (e, já agora, há algum marxista sério que conceba o movimento dialéctico em termos ingenuamente deterministas ou fatalistas?; e digo "marxista" propositadamente, pois duvido muito que boa parte do pessoal do PC seja marxista.).
    O comunismo tem uma história, que é também a das experiências político-económicas de reorganização da sociedade. Foram inúmeros os erros. Foram imperdoáveis muitos deles. Há que aprender com os erros. O projecto de uma revolução social é irrenunciável, a menos que se subscreva cinicamente um pessimismo antropológico com um optimismo capitalista.
    Na altura do artigo revisitado neste post, a religião que estava em plena expansão era a do capitalismo. Trata-se bem de uma religião. O dogma das virtudes do mercado aberto, a fé na iniciativa e gestão privadas e a diabolização do investimento e gestão públicos, a crença no benefício para a sociedade da hiper-riqueza de uma minoria, tudo isto é religião. O ecossistema-Terra pode ser destruído, as desigualdades sociais podem atingir extremos obscenos, mas o que preocupa alguns é denunciar como delírio religioso a crença na possibilidade de uma mudança profunda da sociedade. Como diz Zizek, é mais fácil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo.

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    1. Com tantos anos a escreve num blogue, e mais do que habituar-me a eles, eu já me afeiçoei mesmo a estes comentários que começam por estes preâmbulos típicos em que alguém «confessa» que só cá veio por desfastio, quase um favor de nos ilustrar com o seu iluminado comentário: oh RF, não se sacrifique! Não «torne a pôr aqui as mãos». Não se tenha em tão alta consideração que eu não me sinto seu devedor.
      Os autores deste género de encenação, como aqui o RF (e ser-se o “RF” é logo todo um programa...), têm uma probabilidade altíssima de serem comunistas e, como tal, também têm uma baixíssima capacidade de analisarem de uma forma distanciada e crítica a história do comunismo e tudo aquilo em que o comunismo, porque não acompanhou a evolução das sociedades, degenerou. «Há que aprender com os erros», escreve RF. Isso é óbvio. O que o RF no meio do seu desfastio não percebe e não quer “aprender” é que, na sua essência e desde há décadas, o erro no comunismo é praticamente TUDO. Nos seus legados também.

      Outro dia, e apenas para dar um, e só um, exemplo recente, estive para manifestar aqui neste blogue o meu espanto, ao ouvir um discurso de Jerónimo de Sousa, proferido em Baleizão por ocasião do 56º aniversário do assassinato de Catarina Eufémia*, em que ele conseguiu estar um quarto de hora a discursar** sem dar qualquer destaque aos trabalhadores jornaleiros dos tempos modernos (nepaleses, bengalis, etc.), que hoje são tão vítimas da «exploração capitalista» quanto Catarina o foi...
      Note-se que eu, não subscrevendo a ideologia nem a religiosidade da coisa, tendo a respeitar ao menos a coerência. Que aqui não encontro: qual é a passagem do «Proletários de todo o Mundo, uni-vos» que Jerónimo entende de maneira diferente da minha?

      *Catarina Eufémia, que é uma das “santas” da religião (https://herdeirodeaecio.blogspot.com/2009/05/imagens-de-outros-santos-portugueses-2.html)

      **Podem-no comprovar neste vídeo publicado pelo próprio PCP https://www.youtube.com/watch?v=d6CMazybym0&t=36s

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    2. O meu comunismo não é o do Jerónimo Sousa. Nem do Lénine, nem de Trotsky, nem de Estaline, nem de Mao... E não concebo o comunismo nem como religião nem como ideologia, antes como a projecção desejante de uma alternativa ao capitalismo com base em certos princípios éticos que não podem ser utópicos, mas ancorados numa compreensão filosófica e científica. A referência a Zizek devia ter dado a entender isso. A redução do comunismo quer ao chamado socialismo real quer a uma doutrina programática fixa é uma estratégia ideologicamente comprometida, seja ou não reconhecida como tal.

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  2. «O meu comunismo não é o do Jerónimo Sousa. Nem do Lénine, nem de Trotsky, nem de Estaline, nem de Mao...»

    É um comunismo "tão puro" que só você sabe o que é e só você é que o sabe definir. Torna-se numa "coisinha fofinha e adocicada" que tem apenas o inconveniente de ninguém estar interessado em o discutir consigo, porque aquilo de que fala pura e simplesmente não existe.

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  3. Então sempre voltou, oh "RF"?...

    Esteja à vontade, mas não faça tantas juras de cá não voltar e só não lhe digo mais nada porque alguém já se me antecipou.

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