28 agosto 2015

NÚMEROS (em versão Raquel Varela)

Depois da versão original do meu amigo Ricardo Leite Pinto e da minha, permitam-me acrescentar uma terceira versão de números, agora na perspectiva da grande comunicadora que é Raquel Varela. Reconheça-se que comunicador sem outro atributo – José Hermano Saraiva era também um grande comunicador – pode tornar-se num eufemismo codificado, qualificando alguém que consegue criar uma grande empatia com um auditória enquanto se presta a dar os mais despudorados pontapés no rigor científico do tema sobre o qual comunica. É o caso. Anteontem, Raquel Varela publicou no facebook uma estatística bombástica sobre a taxa de insucesso das empresas recém-formadas (start-ups): 97%. No meio do corrupio de encómios que se segue à constatação acompanhados da consequente arenga ideológica, alguns admiradores mais rigorosos (assinalados abaixo a amarelo) pediram-lhe informações onde aceder às fontes de que se socorrera para tal afirmação. Ora, quando se esperaria que a resposta fosse o título de um ou dois documentos e as correspondentes páginas, senão mesmo o endereço electrónico das fontes de que se socorrera no caso delas estarem directamente acessíveis, a primeira resposta de Raquel Varela foi que as fontes são do INE (obrigado, se fossem da NASA é que me surpreenderiam...); depois Raquel acrescenta que se encontrariam dados acessíveis em teses do ISEG e também do IAMPEI (teria sido útil facilitar o acesso às tais teses, nomeando algumas que estivessem on-line); depois disso seguem-se finalmente dois links, um deles (este http://www.iapmei.pt/resources/download/EmpresasPortugal2012_INE_Mar2014.pdf (onde não encontrei dados que suportassem a afirmação de Raquel Varela) e um outro que, ela confessa não conhecer (alguém lho forneceu...), mas não lhe parecer desinteressante (http://www.researchgate.net/publication/262184651_impacto_do_micro-negcios_na_economia). Mais uma vez, sobre o concreto, nada.
Depois disso e mais uma vez Raquel Varela reconforta-nos com a informação que os dados têm origem no INE (não é o que está em causa mas sim onde é que ela foi buscar os famigerados 97%?), que há umas 50 teses sobre isto (será isto a comprovação que a taxa de insucesso das empresas recém-constituídas em Portugal é de 97%?), mas na tese que a seguir insere em esclarecimento(?) (http://repositorio.ucp.pt/bitstream/10400.14/15550/1/Master's Thesis_Pedro Filipe Abreu.pdf), e apesar das suas 149 páginas, confesso não ter conseguido encontrar lá mais uma vez a demonstração directa ou indirecta dos tais 97% de empresas recém constituídas e falidas. Pode até haver a intuição que o número de fracassos naquele género de empresas será bastante elevado, mas a verdade é que, com aquela afirmação, Raquel Varela concretizou essa intuição apoiada em dados que, no final do diálogo acima, continua sem se perceber onde os terá ido ela recolher (ao documento tal e à página tal!). Para o caso de Raquel Varela e o seu auditório não terem percebido até aqui o que se lhe critica, vai uma certa distância da comprovação concreta dos dados de uma afirmação, à apresentação de um sortido de documentos a respeito do tema a pretexto do qual essa afirmação fora proferida. Não, ao contrário do que o meu amigo Ricardo antecipava – e espero que ele não se aborreça por voltar ainda desta vez ao tema – os números estão muito longe de terem perdido qualquer terreno para as letras.

3 comentários:

  1. Cum caraças, mas ainda há quem ligue importância ao que diz Raquel Varela e ao manicómio onde ela está internada???

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  2. Da última vez que lá fui, a página de facebook da Raquel Varela contava com mais de 10.000 seguidores e a própria contava com 5.000 amigos. O sítio onde falava dos tais “números reais das falências das start-ups - 97%” fora apreciado por 643 pessoas e compartilhado por 428. A afirmação merecera 54 comentários entre os quais se contavam os exemplos descaradamente evasivos que destaquei neste “poste”. No cômputo global, são elementos capazes de deixar Raquel Varela naturalmente impante e qualquer observador atento deprimido quanto a esta manifestação do que pode ser a inteligência média da Humanidade...

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  3. Nao eh por falta de meios de investigacao que a senhora Doutora nao da numeros nem indica as fontes. Ela eh mesmo assim. O Estado so lhe paga o ordenado minimo e a FCT tem sido forreta nas bolsas que lhe atribui para o seu precioso trabalho. Ora, segundo a propria, sem um ordenado condigno, as pessoas nao se esforcam e nao produzem o que poderiam.

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