29 junho 2016

«DO I LOOK GAY TO YOU?»


Ainda a propósito de ir repegar cenas significativas de filmes famosos para as associar ao que tem vindo a acontecer em consequência do referendo britânico, socorramo-nos desta cena de Philadelphia, onde Joe Miller, o advogado que defende os direitos daquele que está a ser discriminado por ter SIDA, é vivamente cumprimentado por um transeunte que encontra numa farmácia. A conversa rapidamente degenera, pois assenta num equívoco: ao contrário das deduções do interlocutor que o felicita e do próprio, Miller não é homossexual, aliás previamente no filme havíamo-lo ouvido dizer: Some of these people (os homossexuais) make me sick. But a law's been broken here. You do remember the law, don't you?* É interessante ver o ar ultrajado de quem considera ter formado a opinião por uma questão de princípio (Miller) quando diante de alguém que lhe parece que a tomou apenas por uma questão utilitária e/ou de clã. É uma atitude que, no caso do referendo britânico, se nota ser até transversal à própria decisão tomada: pode ser só impressão minha, mas ficou-me a impressão inicial que, em geral, quem votou pela continuação na União considerava que a sua decisão fora muito mais amadurecida do que quem votou pela saída. Claro que toda essa pose foi pelo cano abaixo com os expedientes engendrados depois para tentar anular o resultado da votação, sem princípio algum. Entre os que votaram pela saída também haverá de tudo. Como uma imperatriz da Europa, uma czarina, Angela Merkel veio pôr agora um ponto de ordem à mesa: a saída é para valer, mas quando os britânicos estiverem preparados. Num outro registo mais prosaico mas igualmente pragmático, não sei se repararam que, no meio de toda a sua indignação, Joe Miller saiu da farmácia sem ter pago as fraldas...

* Parte dessa gente enoja-me. Mas a Lei foi desrespeitada. Sabes o que é essa coisa da Lei, não sabes?

2 comentários:

  1. Há uma tentativa óbvia de campanha levada a cabo na comunicação social dita de referência, tentativa muito primária e no mínimo bastante desonesta, para criar uma relação de causa-efeito entre um suposto aumento de incidentes xenófobos e a vitória do “Brexit” no referendo (ele é o africano insultado no eléctrico, ele é a portuguesa a quem cuspiram em Londres, e assim sucessivamente…) Todavia, do que nos é reportado, afinal nada de conclusivo se extrai quanto ao facto de tais actos haverem sido cometidos por apoiantes do “Brexit”, e se aqueles não forem inqualificáveis manipulações provocatórias montadas com inconfessáveis intenções, parece-me que os mesmos não passarão de vulgares manifestações de um certo “hooliganismo” característico de certas franjas da sociedade britânica, manifestações nunca deixariam de ocorrer qualquer que fosse o resultado do “Brexit”…

    Enfim, a talhe de foice, os energúmenos que cometeram o desprezível acto de Manchester parecem ser jovens com dezoito/dezanove anos de idade, dos tais a quem o “Brexit” supostamente prejudica… Mas são os defensores deste último que ficam com a fama de xenófobos…

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  2. Completamente de acordo consigo quanto à segunda parte do que escreve: ou se usam os jovens como "vítimas da decisão alheia" quanto ao Brexit, ou se usam os mesmos jovens como protagonistas do "bullying contra os estrangeiros". Mas isso será exigir lógica num assunto em que ela se tem mostrado muito escassa...

    Quanto à primeira parte, creio que a transumância à procura de sangue e violência já levou as atenções para Istambul...

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