23 julho 2022

«FAKE NEWS» DE HÁ CEM ANOS

23 de Julho de 1922. Esta carta de há cem anos, escrita pelo major António Ribeiro de Carvalho, oficial da guarnição do Regimento de Infantaria 19, aquartelado em Chaves, é uma demonstração de como as agora denominadas «fake news» são afinal um fenómeno secular. A carta é uma resposta/esclarecimento a uma crónica que fora publicada dois dias antes no Diário de Lisboa (abaixo), lamentando a ausência do soldado Milhões, herói da Grande Guerra, das festas da cidade de Chaves. Uns escassos quatro anos passados depois do fim daquele conflito, o herói, que era oriundo de uma freguesia das redondezas, e que regressara entretanto à vida civil e que alegadamente vivia com dificuldades, nem sequer fora convidado para as festas da cidade que era a sede da unidade militar pela qual fora mobilizado para França (o RI 19).

A carta do major António Ribeiro de Carvalho apresenta-se como um desmentido célere a tudo isso. O pior é que, para além de se enganar no local da sua naturalidade (freguesia de Jou), o major dá o herói por morto «há coisa de um ano», explicação «simples» para que não tivesse sido convidado às festas da cidade de Chaves. Só que o soldado Milhões não morrera, isso só acontecerá daí por 48 anos(!). O que, pela dimensão da mentira, nos leva a questionar seriamente não apenas toda a argumentação da carta (nomeadamente o interesse assumido do autor da missiva pelo bem estar do herói...), como até mesmo a honestidade intelectual do próprio major António Ribeiro de Carvalho. Então Aníbal Augusto Milhais «único soldado português condecorado em França com a Torre e Espada» tinha morrido e o major nem conseguia precisar a data porque os «seus camaradas de regimento» nem sequer se haviam feito representar na cerimónia?... António Ribeiro de Carvalho era um maçon e um exemplar típico das elites da época... Virá a ser ministro da Guerra durante 70 dias, entre 18 de Dezembro de 1923 e 26 de Fevereiro de 1924.

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