02 junho 2011

OS VOTOS DOS QUE HÃO-DE IR LÁ TER

A canção Que Parva que Sou dos Deolinda terá sido o seu maior sucesso musical, também por ter servido de arma de arremesso político enquanto o seu Movimento Perpétuo Associativo (abaixo) sofre do problema inverso. Apesar de ser um retrato sociológico muito mais arguto e abrangente da nossa sociedade do que a anterior, a canção torna-se antipática pela forma arrasadoramente irónica como nos descreve, divididos entre uma vanguarda de entusiasmados e uma retaguarda dos cautelosos, distinguíveis pelos tons da voz da intérprete, Ana Bacalhau.
A caminho do fim da canção o crescendo do coro dos segundos repetindo o refrão Vão sem mim, que eu vou lá ter… parecendo sugerir-nos como os cautelosos são a esmagadora maioria, a que normalmente não gosta de se pronunciar a não ser quando é directamente instada a fazê-lo e, mesmo aí, costuma recorrer a estratagemas evasivos. É nesta canção que penso quando se publicam estas últimas sondagens eleitorais quando o número dos que se declaram indecisos ronda os 20 a 30% das amostras. Quantos deles é que, no próximo dia das eleições, irão lá ter?
Agora sim, damos a volta a isto!
Agora sim, há pernas para andar!
Agora sim, eu sinto o optimismo!
Vamos em frente, ninguém nos vai parar!

-Agora não, que é hora do almoço...
-Agora não, que é hora do jantar...
-Agora não, que eu acho que não posso...
-Amanhã vou trabalhar...

Agora sim, temos a força toda!
Agora sim, há fé neste querer!
Agora sim, só vejo gente boa!
Vamos em frente e havemos de vencer!

-Agora não, que me dói a barriga...
-Agora não, dizem que vai chover...
-Agora não, que joga o Benfica...
e eu tenho mais que fazer...

Agora sim, cantamos com vontade!
Agora sim, eu sinto a união!
Agora sim, já ouço a liberdade!
Vamos em frente, e é esta a direcção!

-Agora não, que falta um impresso...
-Agora não, que o meu pai não quer...
-Agora não, que há engarrafamentos...
-Vão sem mim, que eu vou lá ter...

Sem comentários:

Enviar um comentário