28 julho 2020

ENTRADA EM VIGOR DA LEI VOLKSWAGEN

28 de Julho de 1960. Começando por algo completamente diferente, reconheça-se que os alemães têm uma grande vantagem moral sobre nós, portugueses, que temos a mania que nos desenrascamos a falar línguas dos outros. A verdade crua é que a língua deles, alemães, desmoraliza-nos logo nas tentativas lusas de arranhar o idioma. Senão vejamos em concreto: não há português desenrascado, nem sequer um Zezé Camarinha poliglota treinado por muitos verões algarvios, que se atreva a dar uma ideia do que é que consiste a seguinte frase: «Gesetz über die Überführung der Anteilsrechte an der Volkswagenwerk Gesellschaft mit beschränkter Haftung in private Hand». (A não ser que saiba alemão e isso é batota para este teste).

É o título oficial de uma lei. Que entrou em vigor há precisamente 60 anos, quando a Volkswagen foi privatizada e transformada numa sociedade por acções. Esta lei, costuma ser referida pela alcunha abreviada (carinhosa?) de VW-Gesetz. Explicando os seus propósitos em termos necessariamente simplificados, essa lei estabelecia que nenhum accionista podia exercer mais de 20% dos direitos de voto na empresa VW, mesmo que detivesse um valor superior de acções. Na época em que foi promulgada, o objectivo do sector público era reter a influência sobre este importante fabricante de automóveis, uma vez que no processo de privatização se concedera ao estado federado da Baixa Saxónia uma minoria de bloqueio, ou seja, um direito de veto em todas as decisões importantes da empresa, através de uma participação qualificada de 20,2% do capital da VW.

Mas o significado principal do gesto, que justifica esta evocação 60 anos depois, foi político. Numa Alemanha (Ocidental) que ressurgia, economicamente cada vez mais pujante, quinze anos depois do fim da Segunda Guerra Mundial, a promoção dada a este aspecto social de quem detinha o capital das grandes empresas, conferia ao capitalismo da Alemanha reconstruída características híbridas entre os interesses privados e o interesse público. Pelo menos, essa era a aparência e foi a partir disso que se construiu uma reputação... Mas é uma fama sem proveito: em contraste com a VW, comprove-se que há outros construtores automóveis alemães que assumiram uma estrutura de capitais bem mais convencional, como sempre foi o caso das participações da família Quandt na BMW. Mas a fama é o que interessa. Esta VW-Gezetz aguentou-se por quase meio século mas veio a ser atacada pelas regras do capitalismo muito mais liberal da União Europeia em 2007; o contra-ataque do governo alemão demorou uma meia dúzia de anos de batalhas legais até se encontrar uma nova situação revista que fosse satisfatória para as partes.

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