25 dezembro 2018

A INVASÃO VIETNAMITA DO CAMBOJA

25 de Dezembro de 1978. Depois de três anos e meio de uma hostilidade progressivamente crescente, em que o último ano se regera até por uma conflitualidade militarmente assumida, o Vietname decide-se a pôr fim às relações agitadas que vinha a manter com o Camboja, invadindo este último país. A campanha militar que se seguiu, uma invasão canónica protagonizada pelos vietnamitas, pode ser sintetizada e simbolizada pela fotografia acima: dois prisioneiros cambojanos na frente da foto (o da direita usa o krama, o lenço identificativo dos khmers vermelhos) são conduzidos pelo meio de uma plantação por dois soldados vietnamitas armados (no da esquerda reconhece-se o tradicional capacete norte-vietnamita). A vitória dos invasores - como se pode ver pelo vídeo abaixo - demorou apenas um par de semanas: a 7 de Janeiro de 1979 eles haviam conquistado Phnom Penh, a capital cambojana, onde instalaram um governo composto por cambojanos, mas obediente às suas directivas. Mas esses episódios iriam ser apenas o começo de um novo conflito sangrento que se iria prolongar por mais dez anos, em que as novas autoridades e o Vietname, agora como força ocupante, iriam ser contestadas por uma guerrilha patrocinada pela China e - numa certa vindicta - pelos Estados Unidos. Ao longo desses dez anos (1979-1989), centenas de milhar de conscritos vietnamitas passaram pelo Camboja como tropas de ocupação, num rodízio que, apenas por ser desconhecido no Ocidente, não deixa de ser menos real nos seus traumas e consequências. Com a clarividência adquirida nestes 40 anos, tratou-se de uma guerra onde se confrontaram os maus... e os péssimos.

Mas isso é apenas parte da história de há 40 anos que aqui se quer contar. Outra parte tem a ver com a forma como a imprensa comunista (e não só) de então tentava digerir acontecimentos que escavacam toda a narrativa romântica como se concluíra a história da Guerra do Vietname. Esta última acabara num happy end, com a queda de Saigão e a vitória dos mais fracos versus o ogre norte-americano. Só que a História continua, e a continuação deu em expor as clivagens nacionalistas e ideológicas entre as várias facções vencedoras. Se os conflitos entre países capitalistas eram apenas uma consequência da natureza malévola desses regimes e se os conflitos entre países capitalistas e socialistas tinham a limpidez cristalina de quem eram os bons e de quem eram os maus, para um jornal como o Diário de Lisboa de 26 de Dezembro de 1978 (não havia edição no dia de Natal), noticiar a invasão de um país socialista (Camboja) por outro país socialista (Vietname) era uma atrapalhação dialéctica. É assim que vemos o assunto a ser remetido para uma página interior (p.12), misturado entre assuntos avulso e com menor destaque que a instauração da lei marcial na Turquia ou a aprovação de um novo plano económico na China. E repare-se que, mesmo salvaguardando os exageros, normais nestas ocasiões, o Vietname anunciava então a morte de 400 soldados inimigos como um indicador da violência dos combates. Porque o período noticioso (natalício) é rigorosamente o mesmo, e as paragens geográficas próximas, tome-se para referência o destaque noticioso que está a ser dado a um número semelhante de mortos provocados pelo tsunami na Indonésia...

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