Completam-se hoje 72 anos que a bordo de um cruzador japonês foi assinado um cessar-fogo que pôs fim a esta breve guerra entre franceses e tailandeses, um episódio que tende a passar desapercebido entre todos os acontecimentos associados à Segunda Guerra Mundial. O reino da Tailândia fora um dos raros países asiáticos a escapar à voracidade colonial das potências europeias. Mas, mesmo tendo conseguido preservar a sua independência, muitas das regiões adjacentes, acabaram por ser anexadas por franceses e britânicos ao longo do último terço do Século XIX, entrando pelos primórdios do XX (1867-1909) como se comprova no mapa acima.
Uma das preocupações centrais da Tailândia nesses anos de supremacia mundial do homem branco era a de procurar realçar, sempre que possível, o estatuto do país. Envolveu-se na Primeira Guerra Mundial do lado da Entente em Julho de 1917. Chegou a enviar um pequeno grupo expedicionário para França, onde se contava até uma esquadrilha de aviação. A atenção dedicada às forças armadas e à sua modernização tornaram-se uma outra expressão dessa preocupação com o estatuto da Tailândia e uma consequência disso foi a importância delas na condução da vida política do país: desde o Golpe de 1932 que os militares dirigiram o país.
Em 1940 a Tailândia era um país de média dimensão (15 milhões de habitantes) dirigido pelo General Phibunsongkhram (acima, 1897-1964). A Segunda Guerra Mundial começara no ano anterior mas ainda não atingira a Ásia em pleno. Porém, já se sentiam alguns dos seus efeitos colaterais. A derrota da França perante a Alemanha em Junho de 1940 fora um deles e Phibunsongkhram estava apostado em aproveitar a debilidade gaulesa para recuperar algumas das cedências territoriais que a Tailândia fora obrigada a fazer décadas atrás. Mas as autoridades coloniais francesas na Indochina nem se dignaram reagir às pressões diplomáticas tailandesas iniciais.
Do lado tailandês subiu-se a parada, encenando umas manifestações em Bangkok onde se exigia o regresso dos territórios cedidos (acima), pretexto para o aumento da tensão fronteiriça e o reforço do dispositivo militar (abaixo). No terreno, quase se equivalendo em efectivos (60 e 50 mil, respectivamente), os tailandeses superiorizavam-se paradoxalmente aos franceses na tecnologia: nos blindados, na artilharia e, sobretudo, na aviação. Só no mar a vantagem era francesa. O conflito, que tinha vindo a decorrer surdamente junto às fronteiras desde Outubro, veio a ser assumido com a invasão tailandesa da Indochina francesa nos princípios de Janeiro de 1941.
Procurando equilibrar a superioridade demonstrada pelo inimigo em terra e no ar, o Almirante Jean Decoux (1884-1963) fez avançar as suas forças navais francesas que se superiorizaram decisivamente às tailandesas na batalha naval de Koh Chang em 17 de Janeiro de 1941. Mas a situação estratégica do governo colonial na Indochina, obediente a Vichy era extremamente precária: haviam-se incompatibilizado com os antigos parceiros britânicos, que controlavam o Oceano Índico, por onde teriam de vir quaisquer reforços da metrópole; viam-se submetidos à pressão japonesa, que já os haviam instado a autorizarem a instalação de bases suas no Norte do Vietname.
Foi sob o patrocínio destes últimos que decorreram as negociações que levaram à assinatura do cessar-fogo de que hoje se celebra a efeméride. O local foi o cruzador nipónico Natori. Os maiores beneficiados imediatos dessa assinatura foram as autoridades coloniais francesas, porque a situação no terreno lhes estava a evoluir de forma desfavorável. Apesar da vitória em Koh Chang, o número de prisioneiros franceses (acima) ou as fotos com troféus capturados (abaixo, trata-se de um estandarte da famosa Legião Estrangeira) exibem uma imagem quase desconhecida de outra derrota de uma potência europeia diante de um povo de cor…
Todavia, os grandes vencedores a prazo, ao permitirem-lhes exercer um direito de tutela, foram os japoneses. Concedendo-lhes algumas províncias limítrofes no Tratado de Paz assinado em Maio de 1941, a Tailândia viu-se empurrada (embora muito maltratada) para a órbita nipónica. O desfecho da Segunda Guerra Mundial, imediatamente depois da qual a Tailândia teve que devolver as províncias que recebera, tornou todo este episódio convenientemente esquecível do ponto de vista político por qualquer das partes. Do ponto de vista militar contudo, a vitória tailandesa foi um feito de armas e desde 1941 que um monumento se ergue em Bangkok comemorando-a.