19 março 2017

MERKEL, TRUMP, A NATO E A LIGA DE DELOS


Quem liga a estas coisas tem-se divertido ou indignado imenso com os momentos protocolares que se seguiram ao encontro em Washington entre Angela Merkel e o anfitrião Donald Trump, com o momento antipático do presidente americano ao recusar-se às convenções de cumprimentar a convidada para as fotografias. A reputação de Trump em termos de gaffes consegue ser já pior que a do já esquecido Sílvio Berlusconi. Mas aquilo que considero pior nele nem sequer serão estas imagens, que tem um (mau) impacto imediato, é o que ele depois fez por detrás, estes dois tweets abaixo, produzidos já depois da visita e das conversações: Apesar do que ouviram nas NOTÍCIAS FALSAS tive um GRANDE encontro com a Chanceler alemã Angela Merkel. Contudo, a Alemanha deve... ...uma vasta quantia de dinheiro à NATO e os Estados Unidos devem ser mais bem remunerados pela poderosa e caríssima defesa que asseguram à Alemanha!
Aparentemente Angela Merkel levou a sua adiante e Donald Trump saiu da reunião com uma enorme azia e esta reacção será a desforra de quem não gosta de ser contrariado. Mas o mais bizarro nem sequer foi o gesto. Foi a forma como foi redigido este seu comentário, que sugere uma perceptível falta de entendimento do funcionamento da organização, suspeita que alguma imprensa não tardou a assinalar. A forma como Donald Trump conceberá o financiamento da NATO (organização fundada em 1949) parece equiparar-se à da Liga de Delos da Grécia clássica (fundada em 478 a.C.). Nesta última é que só as grandes cidades é que forneciam os meios humanos e materiais para a defesa comum, nomeadamente os navios; as contribuições das cidades menores eram todas em dinheiro (abaixo à esquerda), o que dava origem a um importante tesouro acumulado, que esteve originalmente sedeado na cidade de Delos. Daí o nome da Liga. 2427 anos depois, esse processo de financiamento das alianças militares já estaria um pouco obsoleto e o da NATO é diferente. Cada membro é responsável por financiar os seus próprios meios de defesa, na maioria das vezes adaptados à sua dimensão. Até mesmo um país pequeno como o Luxemburgo contribui para o esforço comum com uma companhia. Mesmo que os Estados Unidos os subsidiem, os países membros da NATO não compram segurança aos Estados Unidos, como se depreenderá das palavras dos tweets acima..
Alguém recentemente me chamou a atenção (quiçá com toda a razão) para que eu não subestimasse Donald Trump, tendo em consideração o rol de derrotados que ele já deixou pelo caminho por terem feito isso mesmo, mas o que me ocorre nestes momentos é precisamente o sentimento contrário: não estaremos nós a cometer o erro de sobrestimar Donald Trump?

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